Deitar-me-ei
quinta-feira, junho 14
Café e Lençóis
Quando os primeiros quentes raios
de Sol invadem o nosso quarto despertam-me para o dia e alegre te vejo ao meu
lado, adormecido. Não sei se por um ou trinta minutos ou mesmo pela eternidade
ponho-me a te observar com perícia. Tão doce és! Teu cabelo bagunçado, a barba
sempre mal feita, Deus! Todos os teus traços que amo. Levanto-me e sei que é
nesse momento que irás abrir os olhos, então, viro-me com meu melhor sorriso e
me sorris de volta com ternura até que em silêncio eu deixe o quarto e você se enrolando entre os lençóis. Feliz preparo
nosso café, cantarolo qualquer coisa e sei que de longe me ouvindo sorris. É
tudo simples. Volto ou chego, com cara de sono, cabelos mais bagunçados que os
teus e duas xícaras de café amargo. Abraças-me com o olhar e tudo é claro e
belo e sensível. Amo-te, sabes. Deixo o café ao lado da cama, está quente,
flutuo até a janela e contemplo o céu inocente – me acompanhas. Ah, teu corpo
quente me enlaça por trás e estremeço como se fosse a primeira vez. Percorres
meu pescoço, ombros, costas. Rio. Rimos. Desfaço-me do abraço e corro para a
cama. Como um satélite, me segues. O café vai esfriar. Mordo o lábio e tu
mostras-me os dentes para esta engraçada repreensão. Debruças teu corpo sobre
mim, sem possibilidade de fuga e sussurras ternamente O café pode esfriar, nós dois nunca... Abraço-te forte como se
fosse para sempre e concordamos em beber o café. Olhos que se seguem, lábios
que se desejam ocultos pelas xícaras, sorrimos – não vejo, mas sei. Quanta
pressa a nossa e digo-te que alguém já me disse desejos são sempre urgentes.
domingo, abril 15
Ti Voglio
Oh, eu com
bosques atravessados em minha mente
E o tempo pendendo sobre colheres de caféEu sei, me contam
Há corações palpitantes em todos os lugares
E cipestres negros ao barulho do vento.
quinta-feira, abril 5
O que não é dito
És a pior mulher de todas as
mulheres
Crês que é as única que
sofre, que geme
Que ama, que chora. A única
sempre.
Pensas que teu útero é o
divino cálice
Onde correrão todos os bons
líquidos
Pois pensas que és a verdade
suprema
A vontade de todos os homens,
pobre mulher.
Se vês outra beldade feminina
aos prantos
Das lágrimas de um porto
abandonado
Logo tu se comparas, se
antepara às dores
Que a ti são alheias, pois
não és mulher pura
Para compartilhar a dor do
sacramento
Sentes inveja e não sentes
nada
O que não sabes é que não és
O bastante para ser amada,
Pobre mulher ordinária!
sexta-feira, março 9
Libertad
- Você
tem cheiro de sereno.
- Como
assim?
- Cheiro
de noite.
- O
que você espera que eu responda?
- Nada.
- Então
por que me olha com esse olhar de quem espera por palavras?
- São
apenas meus olhos, não há como mudar.
- Facilitaria
muita coisa pra mim.
- Não
entendo porque sempre tens que ser tão rude.
(Silêncio)
- Sempre
esquiva, sempre hesitante. Qual é a porra do seu medo?
- Descobrir que tenho suas respostas.
quarta-feira, fevereiro 22
Partir
É claro que ela disse que era eterno, e eu acreditei mesmo sabendo que não era verdade, mais cedo ou mais tarde ela teria que ir embora. Assim como o dia se desfaz em noite, teria que partir. A partida não nos era fácil de engolir, porém com o tempo tornou-se sólido, irremediável, acabamos por aceitar, e pior; com o passar dos dias, nos adaptamos, transformando tardes de sorrisos numa ininterrupta espera angustiante pelo dia em que ela partiria. Nos deixamos à esmo, desacreditamos e rescindimos muitas juras que antes eram eternas. Ela sorriu, sorriu como nunca sorrira, sorriu de deboche, pensei. Já não andava com minhas camisas, não me visitava com tanta frequência e percebi que esse era o sinal de que tanto compreendíamos quando permanecíamos em silêncio após nos amarmos. Era assim que sentíamos a sina imutável: No silêncio. Nosso amor era lindo, violento e intenso, mas quando acabava, ela se deleitava em meus braços e permanecíamos horas de olhos abertos para a realidade esmagante. Nem toda a beleza de nosso amor era capaz de nos tracejar sorrisos após nos amarmos, ficávamos imóveis, fundidos em pensamentos transcendentais que nos mostravam com fatos passados que o amor não perdura.
Ela então fingia emoções, me olhava com o rabo dos olhos – e que rabo e que olhos lindos – e se mostrava satisfeita conosco. Nosso amor jamais seria o suficiente, nosso amor não era eterno. Nosso amor não era eterno assim como todos os outros que nós e o resto do mundo vivera, vive ou viveria. Eles vêm e vão como correntezas, nos levam pedaços, nos fazem implorar por maior estadia, mas não adianta. Qualquer um com um pouco de sensatez e juízo saberia que disso não há como escapar. Ela sorriu, me beijou os lábios como há muito não beijava – que lábios, pensei – disse que precisava arrumar suas coisas e passar um tempo com sua mãe naquela cidadezinha repugnante. Eu compreendi, aceitei, dei-lhe espaço, rasguei-me por dentro. Era muito pior do que eu pensava. Vê-la ir embora era como arrancar um braço ou uma perna, sentiria aquele vazio e ficaria derrubado por muito. Ela disse que era eterno e mesmo eu sabendo que não era verdade, acreditei. E foi por esse motivo que eu passei a desprezá-la quando ela fechou a porta e foi embora.
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